domingo, 30 de maio de 2010

Resenha crítica: "Nós que aqui estamos por vós esperamos"

É um documentário desenvolvido em 1998 por Marcelo Masagão. O cineasta chegou a estudar Psicologia na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC) de 1978 a 1982, mas não concluiu o curso.

O título Nós que aqui estamos, por vós esperamos, foi inspirado na frase existente no letreiro de um cemitério brasileiro e vem de encontro com a mensagem embutida durante o filme, de que a morte é inevitável, mas o que vale são os feitos durante a vida. Esses foram relembrados por Masagão em quase uma hora de retratos, cenas e imagens, envolvendo homens e mulheres comuns quanto ilustres, que fizeram história durante o século XX. O diretor resume sua obra com a seguinte frase: “ O historiador é o rei. Freud, a rainha. Pequenas histórias. Grandes personagens do breve século XX.”

O documentário não segue uma ordem cronológica de acontecimentos, nem possui atores ou narrador. O diretor quis seguir um roteiro por grupos de importância, apresentando frases de impacto com imagens igualmente impactantes. Nos primeiros minutos, Masagão apresenta estudiosos como Freud com sua psicanálise, e Einstein com sua física; apresenta também algumas mudanças e descobertas do século como a máquina fotográfica, a industrialização, a inserção da mulher no mercado de trabalho, o metrô, o telefone. Algumas das frases que ilustram este cenário: “O balé já não era clássico. A cidade já não cheirava a cavalo. Pelo túnel, o metrô. Pelo fio preto, a fala”. Outra citação: “Garotas trocavam o corpete, pela máquina de escrever” e ainda: “os quadros já eram Picasso. Os sonhos já eram interpretados”.

Posteriormente Masagão traça a história de homens comuns, ao mesmo tempo que vai mostrando a evolução dos acontecimentos, como por exemplo, Alex Anderson, trabalhava na empresa Ford, ajudou a produzir milhares deles, mas nunca teve seu carro. Morreu de gripe espanhola. Conta nesta brecha o cineasta, que o tempo de produção de um automóvel que antes era de 14h passou para 1h 33 min. Salientou que os trabalhadores labutavam 12 horas por dia, inclusive aos sábados. Assim, o filme mostra através do exemplo de um homem comum que fez parte da história do século XX como funcionava a administração clássica de produção e a mecanização do trabalhador.

O documentário retrata ainda, as duas Guerras Mundiais, além da Guerra do Golfo. Este relato vem com imagens bastante chocantes, com partes do corpo humano mutiladas, bem como outros horrores da guerra. Apresenta também o Crash da Bolsa em 1929.

Em outro bloco, Masagão apresenta diferentes líderes como Hitler, Mao Tsé-Tung, Mussolini, Pol Pot. Franco, Salazar, Idi Amin, Ceausescu, Ferdinand Marcos, Pinochet, Reza Pahlevi. Nesta mesma perspectiva apresenta escritores, estudiosos e cientistas, apresentando a cada um com frases escritas por eles. A viagem para a Lua também é citada.

Uma das cenas mais belas do documentário fica a cargo da junção entre dança e futebol, quando Masagão apresenta Fred Astaire (1899-1987) e Mané Garrincha (1933-1983) se movimentando de forma ritmada, um jogando futebol e o outro dançando. O toque da música ao fundo parecia que estava sendo ouvida por ambos que seguiam o mesmo compasso, cada um fazendo a sua arte.

Outra parte do documentário é dedicada às mulheres, os feitos e suas respectivas autoras: a ousadia do maiô; a mulher fumando seu primeiro cigarro em público; a conquista do direito ao voto; os sutiãs queimados em praça pública; o surgimento da mini-saia; a mulher escritora, estilista, trabalhadora.

Posteriormente o documentário aborda o surgimento dos bens de consumo em massa: a casa própria, a televisão, os eletrodomésticos, os carros; o surgimento da luz elétrica, do rádio e da aspirina. E por fim, o documentário procurou retratar a forma com que cada país exerce sua crença e seu apego com Deus.

O filme resgata sonhos humanos, e até porque não dizer sua ingenuidade diante de certos aspectos, como o brasileiro Arthur Bispo do Rosário que em 1980 fez uma roupa especial dotada de asa, para se encontrar com Deus; ou o caso do alfaiate M. Reisfeld que em 1911 pulou da Torre Eiffel. O documentário mostra também a vaidade humana, a busca por poder, as discrepâncias sociais. E um traço marcante não somente do século XX que frisa o vazio do homem moderno que possui bem-estar e prazer, porém é infeliz e descontente, suas verdades são negociáveis, tudo é relativo, demonstrando assim o ser humano frágil, alheio ao que é valoroso, inconsciente e fraco que se apresenta no final do século XX.

Por fim, pode-se concluir que existem muitos aspectos positivos advindos do século XX derivados entre outras coisas pelo avanço da ciência e da tecnologia. Por outro lado há a proliferação do consumismo e da permissividade, informações não informativas que vão aos poucos gerando indivíduos imaturos, caracterizados pela desorientação, pela inversão de valores e vazio espiritual, pela descrença, pelo pessimismo, pelo falta de compromisso. Diante de tal perspectiva cresce a ansiedade carregada de incertezas e de maus presságios. O homem busca ser feliz, mas nessa sede por encontrar a felicidade acaba se apegando ao efêmero. A forma mais concreta do homem completar este vazio é recuperando seus referenciais, seus valores existenciais, sua fé, seu lado espiritual e o respeito por si e pelos seus semelhantes.

Este documentário foi elaborado há mais de dez anos, mas seu contexto ainda é muito propício para os dias atuais, além disso, é multidisciplinar, pois aborda desde conhecimento gerais, incluindo História, Psicologia, Artes, Geografia e Política. Enfim, é um vasto material para discussão e análise.


Ficha técnica:
Nós que aqui estamos por vós esperamos. Brasil. 1998.
Direção e Roteiro: Marcelo Masagão.
Música: Win Mestens.
Duração: 55 minutos

3 comentários:

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  2. Sensacional o documentário, aquela musica mexendo com o emocional. muito bom mesmo.

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  3. É... entendi o porquê do nome do documentário ser "Nós que Aqui Estamos, Por Vós Esperamos". Porque depois que você assiste dá vontade de cortar os pulsos. Só queria poder "desver".

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